terça-feira, 30 de agosto de 2016

Anterioridade penal e lei penal no tempo



Anterioridade da Lei



        Art. 1º - Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal.

O primeiro dispositivo do Código Penal não versa apenas sobre o princípio da anterioridade penal, mas sobre o princípio da legalidade como um todo. O princípio da anterioridade é apenas um dos desdobramentos do princípio da legalidade.

Desdobramentos do princípio da legalidade:

1) anterioridade da lei (lege praevia) Verdadeiro alicerce da segurança jurídica, a anterioridade da lei penal é fundamental para assegurar que o Estado não exerça o jus puniendi com discricionariedade absoluta, ou seja, não pode o legislador criar normas penais incriminadoras para reger atos cometidos no passado, sob pena de legitimação de uma prática legislativa de exceção.

Art. 5º - CF:


XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;

XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu;

2) reserva legal (lege scripta) - Determina que a pena requer lei escrita, não sendo admitida a criação de norma penal incriminadora mediante aplicação do direito costumeiro, uma vez que este não pode ser fonte imediata do direito penal. Entretanto, o costume é aceito na integração das normas permissivas, in bonam partem, mas nunca em detrimento dos direitos individuais do acusado;

3) proibição de analogia in malam partem (lege stricta) - A analogia é um dos métodos utilizados para a integração do ordenamento jurídico diante de lacunas. Na analogia, o caso para o qual não haja expressa regulamentação legal é solucionado mediante o emprego de regra aplicável a casos similares, análogos. Somente a analogia in malam partem é vedada.

4) taxatividade (lege certa) - Preconiza que a lei penal deve ser concreta, taxativa, com conteúdo determinado. A lei deve descrever de modo claro, ainda que contenha elementos generalizantes/ampliativos (tipos penais abertos), o ato que se considera crime. A falta de taxatividade gera incerteza e abre um campo imenso para o florescer de arbitrariedades do órgão julgador. A taxatividade visa ao afastamento de imprecisões e vagueza nas normas penais incriminadoras.


 Lei penal no tempo

        Art. 2º - Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória. 

Trata da abolitio criminis. Se a lei nova trata fato anteriormente considerado ilícito como fato lícito, o jus puniendi do Estado resta prejudicado, sendo obrigatório que faça cessar a execução e efeitos penais da sentença condenatória, uma vez que não mais subsiste justa razão para a punir o autor do fato doravante lícito. Trata-se de norma que estabelece relação de retroatividade entre a lei posterior revogadora e a lei anterior incriminadora.

Parágrafo único - A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado.

Estabelece a retroatividade da lei mais benéfica ao agente. A lei posterior revoga a norma antiga sob a qual foi cometido o crime, operando efeitos retroativos mesmo sobre as sentenças condenatórias definitivas, atenuando, de algum modo, a pena imposta.

Além da retroatividade, a lei penal pode ser dotada de ultratividade, ou seja, estende seus efeitos para além de sua vigência, para momento posterior à sua revogação. Com isso, se o indivíduo comete crime sob o regramento de uma lei e, meses depois, ela vem a ser revogada por lei que estabeleceu pena com tempo de reclusão 3 vezes superior ao da primeira, é imperativo que o juiz aplique a lei anterior, respeitando a ultratividade da lei benéfica.

 



 Lei excepcional ou temporária

Art. 3º - A lei excepcional ou temporária, embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência.

Esse prolongamento da aplicação das leis excepcionais e temporárias é necessário, uma vez que não faria sentido elaborar lei destinada a viger por alguns anos somente e, após a entrada de lei sucessora em vigor, admitir que esta fosse aplicada retroativamente.

    Tempo do crime

        Art. 4º - Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o momento do resultado.

Nosso código adotou a teoria da atividade (tempus regit actum) para o tempo do crime, considerando este praticado no momento da ação ou omissão. Nos crimes permanentes, o tempo do crime é considerado o tempo da cessação da permanência. 

Sobre os crimes continuados e permanentes, importante conhecer o teor da súmula 711 do STF: "A LEI PENAL MAIS GRAVE APLICA-SE AO CRIME CONTINUADO OU AO CRIME PERMANENTE, SE A SUA VIGÊNCIA É ANTERIOR À CESSAÇÃO DA CONTINUIDADE OU DA PERMANÊNCIA."


QUESTÕES DE REVISÃO


1) (CESPE / Analista - STM / 2011) Por meio do princípio 
constitucional da irretroatividade da lei penal, veda-se que norma penal posterior incida sobre fatos anteriores, assegurando-se, assim, eficácia e vigor à estrita legalidade penal. Nesse sentido, na Constituição Federal de 1988 (CF), garante-se a ultratividade da lei penal mais benéfica.

Certo ou errado?

2) (CESPE / Analista de Trânsito – DETRAN-DF / 2009) O princípio da legalidade veda o uso da analogia in malam partem, e a criação de crimes e penas pelos costumes.

Certo ou errado?

3) (CESPE / Advogado – AGU /2009) O princípio da legalidade, que é desdobrado nos princípios da reserva legal e da anterioridade, não se aplica às medidas de segurança, que não possuem natureza de pena, pois a parte geral do Código Penal apenas se refere aos crimes e contravenções penais.

Certo ou errado?

4) (CESPE / Analista judiciário - TRE-MS / 2013) O princípio da legalidade ou princípio da reserva legal não se estende às consequências jurídicas da infração penal, em especial aos efeitos da condenação, nem abarca as medidas de segurança.
Certo ou errado?

5) (CESPE / Analista - TJ-ES / 2011) Considere que um indivíduo pratique dois crimes, em continuidade delitiva, sob a vigência de uma lei, e, após a entrada em vigor de outra lei, que passe a considerá-los hediondos, ele pratique mais três crimes em continuidade delitiva.
Nessa situação, de acordo com o Código Penal, aplicar-se-á a toda a sequência de crimes a lei anterior, por ser mais benéfica ao agente.

Certo ou errado?

6) (CESPE / Analista Judiciário - TRE-ES / 2011) A lei penal que beneficia o agente não apenas retroage para alcançar o fato praticado antes de sua entrada em vigor, como também, embora revogada, continua a reger o fato ocorrido ao tempo de sua vigência.

Certo ou errado?

7) (CESPE / Analista - TRE-MT / 2010) A lei excepcional ou temporária aplica-se aos fatos praticados durante a sua vigência, salvo quando decorrido o período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a determinaram.

Certo ou errado?

8) (CESPE / OAB-SP / 2008) Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais e civis da sentença condenatória.

Certo ou errado?

9) (CESPE / OAB-SP / 2008) Considera-se praticado o crime no momento da produção do resultado.

Certo ou errado?

10) (FCC - Prefeitura de São Paulo - Auditor Fiscal do Município - 2012) César, na vigência da Lei n01, foi condenado à pena de dois meses de detenção, pela prática de determinado delito. A sentença transitou em julgado. Antes do trânsito em julgado, entrou em vigor a Lei no 02, que aumentou a pena desse crime para três meses de detenção. Após o trânsito em julgado, entraram em vigor duas outras leis: a Lei no 03, que reduziu a pena dessa infração penal para um mês de detenção, e a Lei n04, que aboliu o referido delito. Nesse caso, 

a) aplica-se a pena resultante da média aritmética entre as penas de todas as leis referentes à mesma infração penal.

b) não se aplica nenhuma das leis novas, que entraram em vigor após o trânsito em julgado da sentença.

c) aplica-se a Lei no 02, por ter entrado em vigor antes do trânsito em julgado da sentença.

d) aplica-se a Lei n03, por ter mantido a incriminação, com redução da pena imposta.

e) aplica-se a Lei no 04, que deixou de incriminar fato que anteriormente era considerado ilícito penal.

Fundamentos de Direito II

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NOÇÕES DE DIREITO PROCESSUAL PENAL: 1 Princípios Gerais do Processo. 2 Inquérito policial: histórico; natureza; conceito; finalidade; características; fundamento; titularidade; grau de cognição; valor probatório; formas de instauração; notitia criminis; delatio criminis; procedimentos investigativos; indiciamento; garantias do investigado; conclusão; prazos. 3 Prova. 3.1 Exame do corpo de delito e perícias em geral. 3.2 Interrogatório do acusado. 3.3 Confissão. 3.4 Qualificação e oitiva do ofendido. 3.5 Testemunhas. 3.6 Reconhecimento de pessoas e coisas. 3.7 Acareação. 3.8 Documentos de prova. 3.9 Indícios. 3.10 Busca e apreensão. 4 Restrição de liberdade. 4.1 Prisão em flagrante. 4.2 Prisão preventiva. 4.3 Prisão temporária (Lei nº 7.960/1989).

NOÇÕES DE DIREITO PENAL: 1 Aplicação da lei penal. 1.1 Princípios da legalidade e da anterioridade. 1.2 A lei penal no tempo e no espaço. 1.3 Tempo e lugar do crime. 1.4 Lei penal excepcional, especial e temporária. 1.5 Territorialidade e extraterritorialidade da lei penal. 1.6 Pena cumprida no estrangeiro. 1.7 Eficácia da sentença estrangeira. 1.8 Contagem de prazo. 1.9 Frações não computáveis da pena. 1.10 Interpretação da lei penal. 1.11 Analogia. 1.12 Irretroatividade da lei penal. 1.13 Conflito aparente de normas penais. 2 Infração penal: elementos; espécies; sujeito ativo e sujeito passivo. 3 O fato típico e seus elementos. 3.1 Crime consumado e tentado. 3.2 Pena de tentativa. 3.3 Concurso de crimes. 3.4 Ilicitude e causas de exclusão. 3.5 Punibilidade. 3.6 Excesso punível. 3.7 Culpabilidade: elementos e causas d e exclusão. 4 Imputabilidade penal. 5 Crimes. 5.1 Crimes contra a pessoa. 5.2 Crimes contra o patrimônio. 5.3 Crimes contra a fé pública. 5.4 Crimes contra a administração pública. 5.5 Concurso de pessoas.